NEM MELHOR, NEM PIOR, APENAS DIFERENTE.

terça-feira, 9 de março de 2010

Sobre a dor

É íncrível, mas um dia toda dor acaba.É como acordar sem febre depois de noites de agonia.Você se pergunta,distraída: "Onde está a dor que eu deixei aqui?"Foi embora, de repente, sem ser notada, sem alarde.Um dia você percebe que alguma coisa parou de doer.Um dia você entende que não precisa mais daquela dor.Um dia você sente preguiça de sofrer e tem vontade de alongar a alma, estendê-la ao sol.
As dores acabam porque a vida é maior e mais teimosa.Quando se está no olho do furacão, no fundo do abismo, velando um ente amado, rolando na cama vazia, a dor parece eterna, presença maciça, definitiva, que ocupa e devasta.Ela fica ali, sentada no sofá, servindo-se do jantar, pulsando na outra metade do leito, rondando sua intimidade, compartilhando a sua rotina.Lê seus livros, vai ao cinema com você, amiga íntima, inseparável.Torna-se familiar, corriqueira.Essencial.Reverenciada.A dor é um dublê que ocupa o lugar deixado pela sua alma ferida, encolhida,retirada.Despojo de toda perda.Matéria feita de ausências.
Quando se está em dor, a frase que mais se ouve  é:"...vai passar, nada como um dia após o outro,o tempo cura tudo".Naquela hora tudo soa ridículo,leviano,estúpido.Dá vontade de gritar, numa espécia de arrogância e vaidade às avessas:"...você não conhece a minha dor.A minha dor é a maior do mundo e nunca vai passar!"
Cuidado!!!A dor é aderente.Não se apegue demais, não se deixe seduzir.As sombras não protegem, apenas escondem.Não se aprisiona a dor sem torna-se prisioneiro dela. A dor pode virar um vício.O tumor alimentado com diligência.O veneno tomado solenemente.
A dor que não é doença tem um prazo de validade.Cumpre um ciclo.É percurso.Mal necessário, remédio amargo.Expurgo.Esconjuro.Depuração.Quando ela acaba deixa um vazio.Um descampado que será aos poucos inundado pela sua alma alargada, reintegrada que se espalhará como maré alta e tudo contemplará.
As grandes dores parecem inesgotáveis, insaciáveis.Mas, mesmo as dores induzíveis, aquelas das perdas impronunciáveis, as dores abissais, que contrariam as leis da vida, mesmo essas um dia passam.Param de fisgar, de sangrar.Cansam, aquietam.Libertam-se de nós, viram cicatrizes, marcas, tatuagens.
É  comovente e belo trazer  no corpo e na alma as marcas das dores bem vividas. Nada mais natural, que fazer as pazes com as nossas dores.Deixá-las partir sem medo.Lembrá-las sem sobressaltos.Reconhecê-las.Afinal nós também somos aquilo que perdemos.

Um texto de Hilda Lucas




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